O Rio foi a porta de entrada do chá no Brasil e a presença da corte imperial na cidade fez com que o hábito de servir a bebida se instalasse primeiro entre a elite carioca e depois nas camadas mais populares da sociedade. Em Machado de Assis, Relíquias Culinárias, a historiadora Rosa Belluzzo nos revela que “nos tempos de Dom João VI, a sociedade carioca acompanhava os hábitos europeus na elegância, no bom gosto e nas boas maneiras”, um chá era servido da mesma forma da Inglaterra, com bolo inglês e torradas na manteiga.
Em 1812, o príncipe regente solicitou ao Conde de Linhares, seu ministro da Guerra e dos Negócios Estrangeiros, a vinda de um carregamento de mudas de Camellia sinensis da China e mandou plantá-las no Horto Real, atual Jardim Botânico da cidade. O monarca, que nada tinha de bobo, percebeu a expansão do comércio de chá na Europa e América do Norte e resolveu experimentar a lucrativa cultura em solo brasileiro. Não obteve sucesso com os chineses que vieram trabalhar e ensinar as técnicas de plantio e processamento. Os arbustos ficaram abandonados até 1822, quando o novo diretor do Jardim Botânico, o Frei Leandro do Sacramento, descobriu as árvores em meio à floresta.
O religioso botânico encontrou as árvores em meio à floresta e recebeu recursos da Coroa portuguesa para que pudesse disseminar a cultura do chá em outras províncias brasileiras a pedido de D. Pedro I. É de sua autoria o documento Memória Econômica Sobre A Plantação, Cultura e Preparação do Chá, o primeiro manual nacional de trato da planta. Infelizmente, Frei Leandro morreu cedo e, mais uma vez, a Camellia sinensis foi preterida para outras culturas mais rentáveis. Contudo, algumas províncias em São Paulo e Minas Gerais levaram adiante o cultivo em baixa escala.
A bebida, no entanto, deixou a sua marca na capital do império, principalmente em meados do século XIX, quando a efervescência política e social reunia homens e mulheres nas confeitarias cariocas, provando que o chá saía da cena doméstica para ganhar um contorno público. De acordo com estudos da arqueóloga Tânia Andrade Lima a partir de escavações no Rio de Janeiro, o relevante papel das mulheres na introdução e manutenção da cultura do chá no hábito social brasileiro, a partir do séc. XVIII, foi crucial para o seu fortalecimento como ser político, o que acabou acontecendo com mais ímpeto no final do século XIX, após a proclamação da República e o advento da iluminação elétrica, mudando a rotina dos cidadãos drasticamente.
No Brasil oitocentista, os horários das refeições eram bem diferentes, conta Rosa Belluzzo. O almoço era servido às 9h, jantar às 14h e, às 20h, um chá era trazido em grandes bandejas à sala de jantar, com toda a família ao redor da mesa. A efervescência urbana do novo século foi atraindo as mulheres cada vez mais para fora de casa, em passeios ou atividades remuneradas, arrefecendo o costume do tradicional serviço de chá privado. O chá, percebido como símbolo de status feminino, entra em transformação e novas expressões da bebida são oferecidas através da industrialização e capitalismo crescentes.
Com o fim do monopólio português, o Brasil se abre às importações. O domínio comercial era inglês, no entanto, a elite brasileira era bastante sensível à cultura francesa. Em 1813, a Gazeta do Rio de Janeiro (o primeiro periódico impresso no Brasil) publicou um anuncio de um armazém que vendia mostarda e conservas inglesas, além de “vinhos, cerveja, azeite, vinagre e chá de diferentes qualidades”. (Belluzzo, 2010, p.19). A família real costumava finalizar o dia por volta das 20h com o tradicional chá acompanhado por cinco pratos. Esse hábito foi adotado nas casas brasileiras, sendo adaptado de acordo com cada família. O Rio de Janeiro vivia uma época de expansão econômica e prosperidade pois era o principal entreposto comercial exportador de matérias-primas para a Europa e o receptor das importações, escoando o café brasileiro e sediando a opulenta vida dos barões do café.